Todos os tempos acontecem agora, ou, Walter Benjamin
e a força da memória.
José Luiz Quadros de Magalhães
Existimos
em nossa memória. O que é memória? Rubem Alves escreve que existem memórias sem
vida própria (aquilo que a gente decora para fazer a prova) e memória com vida
própria, que aparece quando menos esperamos, que se manifesta sem nossa
intenção, a partir de uma imagem, um cheiro, uma situação. Memória é onde se
guarda as coisas do passado, diria.
Entretanto,
com Benjamin, aprendemos que cada vez que lembramos, esta lembrança ocorre em
uma situação diferente, e para uma pessoa diferente, uma vez que mudamos, mesmo
que não queiramos. Assim, as memórias são muitas, são milhões, bilhões,
infinitas, pois cada um guarda uma memória, e a memória vive, muda com a gente.
Guimarães
Rosa diz que a "estória não quer tornar-se história" e a mesma
revolta de Fernando Pessoa contra os gramáticos, também toma conta de mim.
Agora vêm os donos da forma e dizem que não existe mais "estória",
tudo tornou-se "história"! Ora, ninguém pode querer ser dono da
linguagem: como esses caras querem acabar com a estória? Isto é sem dúvida
muito autoritário. Rubem Alves nos diz que "a história acontece no tempo que aconteceu e não acontece mais. A estória mora no tempo que não aconteceu
para que aconteça sempre".
Assim
podemos pensar a his(es)tória para Benjamin. Os caras no poder escrevem a
história oficial, linear, lógica, contada por eles, morta, numa sucessão de
nomes e fatos em uma lógica linear. Para nós, diante desta história oficial,
como desejam os que estão no poder, só nos resta reproduzir os fatos, decorar
as datas e os nomes, e repeti-los. Benjamin nos chama à revolução. A
his(es)tória nos pertence. A his(es)tória é memória viva, múltipla, plural e
pertence a todos nós e a cada um de nós. Assim, visitar as múltiplas memórias é
um recontar permanente da his(es)tória (em um conceito quântico da história e
estória que se fundem em um terceiro incluído). Alias, em Benjamin, temos um
conceito quântico de história: todos os tempos acontecem agora, e a maneira
como contamos nossa his(es)tória, da forma como construímos coletivamente nossa
memória, dependerá o nosso futuro. O futuro e o passado acontecem agora, na
"agoridade"[1]
revolucionária de Benjamin, quando com coragem tomamos a palavra e construímos
nosso passado a partir da construção de nossa his(es)tória memória, coletiva,
dinâmica e plural, direcionando ou redirecionando o nosso futuro.
Benjamin
nos mostrou que é possível sim, como propõe a física quântica, romper com os
conceitos lineares de tempo e espaço. É possível viajar no tempo, isto está no
nosso alcance: todos os tempos acontecem agora!
[1]
"Agoridade" é a
permanecia infinita do agora, a única coisa que existe(?) - esta interrogação é
a dúvida que também deve ser nossa companheira de viagem, sempre, dolorosa mas
amiga.
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